Abri o dicionário. Ppppppp…
Perdoar: remissão de pena. Absolver, desculpar, esquecer.
Esquecer? O perdão tem conexão com a memória?
Ui, algo não está muito bem! Da minha boca sempre ouvi a sentença irrefutável:
Tantas vezes verbalizei esta…heresia?
– Porquê?
– Para premiar convicções pessoais.
Para fazer chantagem. Para alimentar o ego ditador.Para legar em testamento uma culpa impossível de resgatar…tatuar a ferida em mim e nos outros.
Perpetuar!
Mirrar com a moléstia incubadora da tristeza!
Agora podem perguntar… Vá, estou à espera…se fosse ao contrário, não é?
Se fosse ao contrário? Impressionante!
Ajoelhada, implorava:
– Desculpo, mas perdoar? Nunca!
– Queimem as fotografias!
Queimem as provas! Absolvição, por favor!
Ahhh…lá está… O perdão tem conexão com a memória.
No fundo, reconhecia que “errar” faz parte da condição humana.
– Não, não! Desculpa! Só tu eras digna de tal benefício.
– Pois!
Na Constituição da República Portuguesa tem assento o princípio da igualdade.
Luísa, tu que és o arauto dos direitos humanos, vê lá se mudas qualquer coisa!
Certo! Todos!
Todos merecem uma segunda oportunidade.
Este é o mandamento proferido em decreto régio.
Gostam de cinema? Curta-metragem. Luzes apagadas. Pipocas. Vamos lá…
Em janeiro de 2015 eu e o Telmo decidimos louvar o berço das nossas raízes.
Foram lançadas as primeiras sementes do projeto há muito desejado.
Dois meses depois, a Primavera trouxe mudança. Recebi um convite.
Hummmm…dois caminhos…ficar ou partir. Podia recusar?
Podia, mas a escolha foi outra. Fiz as malas.
A lavoura ficou entre parênteses.
Houve alguém que não gostou. Porquê? Porquêêêê????
Veio a conversa diabólica! Os meus tímpanos…esquartejados! Palavras uivadas em escala de sol menor!
Guardei-as em lugar seguro. Sabem o que aconteceu?Tempos e tempos a carregar um poceiro de pedras.
O Universo conspirava encontros: …ui…que vontade!
Rrrrrrrrrrrrrrrrrr Raiva! Ainda assim:
– Olá!
Com uma pedra na mão, dizia “olá”! Exibia superioridade?
Vês, tu ofendeste-me, mas aqui estou eu!…
Esqueci-me da voz dele!
O Universo conspirava…
Pulmões trémulos e pedra na mão:
– Olá!
Hipocritamente perfumava a atmosfera.
O Universo conspirava… Cansei-me!
O vulcão adormeceu. Lábios cerrados! Olhos no chão!
O meu pensamento… Pensamento? Não! Julgamento!
O meu julgamento era o glaucoma da consciência sensata.
Será que ele não percebe? Nem sequer tem coragem para pedir desculpa!
Anos à espera! A mudez atiçava qualquer coisa…lava a fervilhar?
Talvez! Uma canção veio ter comigo.
Título – Perdão.
Ouvi, ouvi, ouvi. Ouvi vezes sem conta. Um dia… Escutei.
Pedir perdão a quem não consigo perdoar! Como é possível tal proeza?
Ouvi, ouvi, ouvi… comecei a mastigar… Ouvi, ouvi, ouvi… digestão difícil!
A traça da ganância esburacou a honra do compromisso jurado.
Preciso de pedir perdão! Com reverência, preciso de pedir perdão!
Criei expectativas na vida do meu amigo.Ceifei uma aliança.Eu sou a vítima?A que propósito?
Dei conta da súplica diária:
– Pai Nosso… Perdoa as minhas ofensas, assim como eu perdoo a quem já me ofendeu.
Ahhhhh… Eu peço perdão, mas sei perdoar? Sei ou não sei?
Neste caso é muito mais do que isso. Vai além do perdoar. Como posso ousar atirar a primeira pedra?
Magoei. Rasguei. Ignorei. Quero varrer este lixo da memória.
– Espera, espera! Qual lixo?
– As palavras que decidi guardar!
– Só isso?
– Não! Retirar a queixa. Foi apresentada sem qualquer razão!
Ergui a bandeira da paz. Roguei ao Universo! Conspiração?
O encontro aconteceu! Sim, tiritava… O coração, o estômago…as cordas vocais…
Sem qualquer ensaio, foi tricotado um novo ABRAÇO. O melhor abraço de sempre.
O abraço depurador, embrulhado com uma lágrima rejubilante. As nossas vozes voltaram a dançar.
Não quero o poceiro de pedras! É muito pesado! Tanque, sabão azul…esfreguei com vigor… as nódoas da presunção!
Perdão! Aprendi a perdoar? Aprendi a limpar, a absolver, a reconhecer, a dar e receber, a entender.
Não foi só o cérebro que ficou aliviado. Eu fiquei leve! A minha pele ganhou luz.
A minha alma conquistou vivacidade, paz, alegria!
Arrependida? O tempo é bom aliado e o passado um professor doutorado!
Estou feliz! AMO-TE VIDA!
Amo crescer! Amo aprender! Amo libertar-me e libertar quem me rodeia.
Libertar…está na hora, não é? Ide! O que levam na mão? Uma flor?
